"Se tivesse que escolher entre o poder de escrever um poema e o êxtase de um poema não escrito, escolheria o êxtase. Pois este é uma forma superior de poesia." - Khalil Gibran

terça-feira, 13 de abril de 2010

A tradição já não é o que era... by Patanisca Saraiva

Anoiteceu... O Sol foi descansar e a Lua saiu à rua... hoje acordou com vontade de arrasar e produziu-se... e como se produziu!!!! Apareceu completamente cheia de si e mais brilhante que nunca. O Vento, extasiado com a sua beleza, resolveu fazer-lhe companhia. "Hum... tão linda! Tenho que a impressionar!" - pensou ele e começou a soprar e a mostrar o quanto pode ser forte e impressionante. As árvores começaram a encolher-se com medo, as suas folhas ficaram agitadas e, tudo o que estava no chão começou a fugir num corropio frenético.
As nuvens invejosas, apareceram... "Não, essa Lua não vai ficar com as atenções todas para ela" disse uma delas e juntaram-se ficando negras de raiva. E ela começou a chorar e as outras, solidárias, também... E começou a chover...

- Tenho que ir levar o jantar à minha avó. Quando chegar a casa volto a ligar-te.
- Tem cuidado. Formou-se um temporal de repente. Sabes que fico preocupada.
- Não tens porque te preocupar amiga. Vou e volto num ápice. Vá, até mais logo.

M desligou e espreitou pela janela. Calçou as botas de borracha, pôs a sua capa vermelha com o capuz na cabeça, agarrou a sacola e saiu. Assim que saiu do prédio, sentiu a força do Vento que lhe sacudiu o capuz da cabeça e sentiu as meiguices da chuva fria na cara. M recompõs-se, baixou a cabeça e começou a caminhar com passos largos e rápidos. A rua estava deserta... os sons da dança das árvores ao sabor do Vento eram assustadores... a Lua foi ofuscada pelas Nuvens e a noite vestiu-se de negro... "Com um belo vestido preto eu nunca me comprometo". M continuou a caminhar, assustada, olhando em seu redor... Nunca aquela rua pareceu tão grande, tão infinita... M acelerou a sua marcha, a sua respiração ficou mais ofugante e foi assolada por pensamentos negativos... estava completamente cheia de medo... nunca antes acontecera algo semelhante...
Subitamente, M apercebeu-se que não estava mais sozinha naquele palco. O cenário era atemorizador... o coração de M começou a bater ao ritmo da banda sonora do momento, M começou a correr e....
- De que foges minha linda??
M estarreceu ao sentir aquelas mãos nos seus braços, o calor de um peito nas suas costas e uns lábios tocando, ao de leve, a sua orelha, sussurando aquelas palavras...
- Não me faças mal... - soluçou M.
- Mal??? Não te farei mal se tu não fores má para mim - disse, aquele ser enquanto farejava os fios de cabelo de M.
- Deixa-me ir, não tenho nada. Por favor deixa-me ir. Quem és tu?
M sentiu o seu capuz a ser puxado com gentileza pelos dentes daquele homem que logo de seguida lhe diz suavemente: - Quem sou eu? Quem sou eu? Sou aquele que tem uns olhos tão grandes e uma boca tão grande e que te vai fazer feliz. E largou os braços de M deslizando, docemente, as suas mãos neles...
M, já não se sentindo presa, voltou-se para ele num virar rápido e repentino, atirando a sacola para longe e, rasgando a capa vermelha e a camisa, e perguntou ansiosa, prazerosa e loucamente:

- VAIS-ME COMER????????

A tradição já não é o que era....


Um sorriso
Patanisca Saraiva